Hoje dia 3 de fevereiro, a parte de ser o dia depois a Candelária (da qual hoje não falaremos) é a festividade de São Brás, ou Brais como gostamos chamar-lhe na Galiza. São Brás/Brais de Sebaste, medico e santo do século IV ao que se tem atribuído na religião popular entre outras coisas ser avogoso para os males físicos da gorja, funções taumatúrgicas com costumes vinculados como o de portar pendurado do pescoço o "cordão de São Brás" vento em esta data que se praticava -e ainda se segue a praticar e no atual Pais Basco (algo sobre isto aqui e aqui)
Mas agora não trataremos de isto, nem crenças de caráter ornitológico e estacional de estas datas como o "casamento" do pássaros na Candelária ou ditos como "pelo São Brás a cegonha verás"/ "pelo Sao Bras a cegonha cria", senão que abemos prestar atenção a uma peculiar festa que em honor de este santo se celebra no povo de Almoacid del Marquesado, província de Cuenca (Espanha).
Esta festa enlaça com muitas outras que se celebram durante os meses que vão entre outubro a fevereiro com especial ênfase por regula em vários casos tanto peninsulares (uns exemplos aqui e aqui) como europeus nos meses de dezembro-janeiro, coincidindo frequente o fim-principio de ano ou datas próximas a eles. Tipologia festiva da que formam parte as ruidosas processões festivas com disfarces e mascaradas no que o etnografo Julio Caro Baroja denominou como "Ciclo Invernal".
A maioria das festas de este ciclo como é bem sabido terminariam convergindo com o calendário litúrgico cristão e vinculando suas datas ao cômputo da Semana Santa ou bem ao Natal, constituindo o substrato do Entrudo atual.
De estas convergência surdiram rituais ou elementos que faziam dentro de este tempo de licencia social uma critica a própria religião católica como a eleição de falsos "bispos" temporarios, frequentemente pelos meninos ou moços, um eco do qual o podemos ver na mitra bispal que portam os estranhos "homens-demo" de Almoacid.
De esquerda a direita: repressentaçao de um menino bispinho e a sua comitiva em um manuscrito mosteiro Santo Estêvão em Bamberg por volta do 1581/83; pintura mural de final do século XV ou início do século XVI representação de um menino bispo com uma mitra de sino e um joelho de porco na mão na Igreja de São Martinho de Groningen; a Fiesta del Obispillo na cidade de Burgos na actualidade
Não nos vamos estender agora sobre o origem sincrético e complexo, nos substrato ou melhor substratos pré-cristão (e também em parte pré-romanos) de estes costumes, isso tem já uma extensa bibliografia, partindo da modelo monografia El Carnaval de Julio Caro Baroja, e outros mais antigos como o de Michel Meslin ou M. P. Nilsson (referências aqui e aqui) passando por estudos mais recentes varios artigo do nosso colega Pedro-Reyes Moya Maleno (aqui) o qual também dedica parte da sua tese recentemente publicada a esta questão (vid. aqui). Os aspetos sociológicos e de critica ao ordem do Entrudo tem sido estudados igualmente de forma soberbia no capitulo consagrado a isto, na "Cultura Popular na Idade Moderna" do historiador Peter Burke.
Sobre a própria festa da Endiabrada de Almonacid del Marquesado e sobre os "diablos" (diabos) nome que referiam os dançantes se inclui na próprio site web da festa (aqui) um ressume bastante sintético e ilustrativo do ritual e da de alguns detalhes como o uso de mascaras formando parte de ele, do qual quedam apenas testemunhos orais e gráficos, mas que desapareceu progressivamente ao longo do século XX, e hoje já não forma parte da indumentaria canônica dos "diabos"
Em troca de estende-nos em isto deixamos aqui embaixo uma pequena alfaia entográfica: o documentários "Los Diablos Danzantes de Almonacid del Marquesado" que foi realizado durante a época da Ditadura franquista em 1964 dentro da comemoração propagandística do denominado "Año del Pueblo" formando parte de uma serie de documentários folclóricos intitulada Don Aire de España. O documentário tem o interesse suplementar de que tanto este como a seria ao completo tivera como assessor etnográfico ao próprio Caro Baroja (sobre o documentario aqui)
Caro Baroja, J. (2006): El Carnaval. Analisis histórico-cultural. Alianza editorial. Madrid (vid. aqui)
Meslin, M. (1970): La fête des kalendes de janvier dans l'empire romain: étude d'un rituel de Nouvel an. Collection Latomus, Bruxelas
Moya-Maleno, P.R (2007): "Fratrías y ritos de paso en la Hispania céltica: a propósito de los Tunos de Segóbriga" in: AA.VV: Pasado y Presente de los Estudios Celtas. Fundación Ortegalia, Ortigueira PDF (livro completo aqui)
Moya-Maleno, P.R. (2020): Paleoetnología de la Hispania Céltica, Etnoarqueología, etnohistoria y folklore. BAR International Series Nº 2996, 2020, 2 Vols (vid. aqui)
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