quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Ao Oeste sem perder o Norte - Livro

À l'ouest sans perdre le nord

Arb, V., Boulestin, B., Boulud-Gazo, S., Kerouanton, I. (2022):  À l'ouest sans perdre le nord : liber amicorum José Gomez de Soto, Chauvigny, Association des publications chauvinoises, Mémoire Vol. LVI  ISBN: 9791090534728


Sinopse: 

Especialista nas idades dos metais, investigador do CNRS, José Gómez de Soto é daqueles cientistas que sabem partilhar. O chefe da escavação e o professor que foi, trouxeram atrás de si várias gerações de arqueólogos que o quiseram homenagear neste livro.

o arqueologo frente ao Capacete de Agris um dos seus grandes achadegos

Pela qualidade dos contributos recolhidos, este liber amicorum não é apenas uma homenagem ao trabalho científico de José, é também um testemunho de amizade e gratidão para com este homem e este investigador excepcional. Esta coleção de textos é à sua imagem, e conforma-se com o que são “misturas”, homogeneizando elementos mais ou menos diferentes para constituir um todo.

Gómez De Soto nas excavaçoes da Cova de Perrats em 1993

A orla ocidental da França tem a melhor parte, mas o norte, o leste, o sul também um pouco e os mais distantes também são cruzados. Dos megálitos às grutas sepulcrais, dos recintos neolíticos aos tumulus, aos habitats em depósitos, a diversidade dos contextos aqui apresentados é reflexo da diversidade dos seus centros de interesse. Sempre um pouco a oeste, mas nunca perdendo o norte


INDEX

   

+INFO sobre o livro em: À l'ouest sans perdre le nord

terça-feira, 29 de novembro de 2022

A Evolução do Parentesco - Palestra


A Evolução dos Sistemas de Parentesco e Matrimonio


Aproveitamos agora para deixar o vídeo da palestra proferida pela Dr. Laura Fornunato, antropóloga da Universidade de Oxford, especializada em antropologia evolutiva e que se tem abdicado com mais pormenor no desenrolo e condicionamentos dos sistemas de parentesco e matrimonio. 


Em esta palestra faz uma síntese da sua pesquisa sobre estas questões, destacando os condicionantes relacionados com o sistema produtivo e as forma de transmissão da herança a descendência de acordo com o anterior, e a demografia que cada padrão gera.


Amostrando de passo as possibilidades que um estudo não apenas multicultural mas também filogenético pode abordar estas problemáticas, questão que a autora tem aplicado aos sistemas de parentesco das sociedades de origem indo-europeu e austronésio. O qual pressente um grande interessa para arqueólogos não só especializados na proto-história europeia senão também os que estudas a difusão da cultura palita ou para os linguistas em geral, que como é sabido também usam estes tipo métodos. O qual recorda e continua, ainda que com outro metodo e ferramenta, os estudos de Jack Goody sobre a diferença entre sistema familiares euro-asiaticos e africanos.


Sinopse: 

Os sistemas de parentesco e casamento representam as maneiras pelas quais os humanos organizam o parentesco e a reprodução. A pesquisa apresentada em esta palestra estende os fundamentos filosóficos, teóricos e metodológicos da biologia evolutiva para o estudo desses aspetos do comportamento social humano. Especificamente, utiliza a teoria dos jogos para mostrar que a evolução do casamento monogâmico pode ser compreendida com base na teoria da aptidão inclusiva. 

Os resultados mostram que, onde os recursos são transferidos entre gerações, o casamento monogâmico pode ser vantajoso se a divisão de recursos entre os descendentes de múltiplas esposas causar um esgotamento de seu valor adaptativo e/ou se as fêmeas concederem aos maridos maior fidelidade em troca de investimento exclusivo de recursos em seus descendentes.

Avaliam-se os resultados do modelo usando evidências sobre a história e a distribuição transcultural do casamento e estratégias de herança. Isso sugere que o casamento monogâmico pode ter surgido na Eurásia após a adoção da agricultura intensiva, pois a propriedade da terra tornou-se crítica para o sucesso produtivo e reprodutivo. 

 The Evolution of Marriage and Kinship Systems



Pode que também te interesse esta postagem: "Ancestralidade"

sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Ficheiro Epigráficor Nº 238


FICHEIRO EPIGRÁFICO Nº 238 - 2022 



Acaba de sair do prelo o último número da revista Ficheiro Epigráfico, suplemento da revista Conímbriga, editada pelo Instituto de Arqueologia da Universidade de Coimbra. Neste número dá-se notícia de 3 novas inscripções, 

reprodução de instrumental médico romano

Um grafito sobre um fragmento de recipiente de almacenagem (dolium) prccedente de uma villa romana., a segunda uma pequena peça de instrumental medico utilizada para procedimentos otorrinológicos, e que  o valor não apenas de aportar informação sobre a cirurgia romana, senão sobre os próprio facultativos que a exerciam, como em este caso no qual poderíamos estar ante uma mulher exercendo o oficio médico, com indica o seu nome o cognome em da posedora da peça (Parda) em genitivo Pardae ("de Parda").

A conhecida estela funerária de Julia Saturnina  medicae · optimae, Merida (MNAR)


Assunto este da dedicação medica de alguma mulher que se bem não de tudo desconhecido para a Antiguidade, sim é certo que não esta muito sobrado de dados, sobre tudo arqueológicos (textuais algo mais há (uma revisão do tema aqui)


O rio Vouga a seu paso pela antiga freguesia de Lamas do Vouga (Águeda, Aveiro)

Finalmente também se apresenta uma pequena ara sem dedicante consagrada ao deus Vaccus (*Vaccos) divindade que segundo os autores poderia corresponder-se, ou estar associada com o atual rio Vouga, Vaccua na Antiguidade. Em esta contribuição assim mesmo se discute sobre as possíveis implicações que a omissão do oferente pudera ter para conhecer a natureza e local do culto da divindade


INDEX


822 - Fragmento de dolium com grafito da villa do Monte da Cegonha, Selmes, Vidigueira (Conventus Pacensis) 
André Donas Botto, José d'Encarnação, Marco Valente 

 823 - Árula votiva do Castro de Goujoim, Armamar 
 José d'Encarnação, José Carlos Santos 


 824 - Una nueva sonda médica con inscripción 
 Marc Mayer Olivé 




 Ir ao número da revista: FE

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

De Cavalos e Homens no Oriente Próximo


The Spirited Horse 


Recht, L. (2022): The Spirited Horse. Equid–Human Relations in the Bronze Age Near East. Bloomsbury. Londres. ISBN: 978-1-3501-5891-7


Sinopse: 

Este obra apresenta uma nova perspetiva sobre as relações humano-animal no antigo Oriente Próximo, este volume considera como devemos entender os equídeos (cavalos, burros, onagros e vários híbridos) como animais que são atores sociais. 

Asno ou Onagro de electro na cimerira de um passador de rédeas da tumba da rainha Puabi, Necrópole real de Ur, século XXVI a. C 

A autora reúne uma grande quantidade de novos dados do Oriente Próximo, incluindo a cultura material da Idade do Bronze junto com toda variedade de contextos arqueológicos nos que aparecem restos de equídeos, assim como as fontes iconográficas e textuais. Se analisa em particular os achados de restos dos próprios equídeos em enterros, espaços sagrados e assentamentos junto aos artefactos que lhe estão associados, como carruagens ou arreios.

Um dos deposito de equídeos de uma das tumbas da necrópole de Tell Umm el-Marra, Aleppo, Siria, Idade do Bronze

A obra valoriza a agência de animais nas culturas do passado, oferecendo uma interessante leitura essencial para pré-historiadores, arqueólogos e todos aqueles que estudam os processos de domesticação dos primeiros animais. O livro mostrando como é que os humanos encontram e interagem com outros animais e como esses animais, por sua vez, interagem com os humanos. 

Carro tirado por asnos ou onagros em uma cena do chamado Estandarte de Ur, Necrópole Real de Ur

A autora descreve as implicações mais amplas que isto tem para o envolvimento humano com seu ambiente, tanto hoje quanto no passado, e aponta para um estudo mais focado em questões concretas através de vários apêndices

INDEX

 

+INFO sobre o livro: The Spirited Horse

terça-feira, 22 de novembro de 2022

O Corpo na Pré- e Proto-história Peninsular


A representação do corpo em objetos e os ‘mundos corporais’ Pré- e Proto-históricos da Península Ibérica


Deixamos aqui o enlace ao vídeo disponiviliçado na sua canal pelo professor V. Oliveira Jorge de uma palestra proferida pela arqueologa Ana Amor Santos o passado dia 19 de novembro em Porto. Palestra organizaçada pela Associação para o desenvolvimento da cooperação em Arqueologia Peninsular (ADECAP) e a Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia (SPAE).

Sinopse: 

Esta apresentação pretende dar a conhecer algumas considerações desenvolvidas na dissertação de mestrado da autora (disponível aqui), onde analisou a representação direta e indireta do corpo humano em diferentes materiais móveis datados do Neolítico à Idade do Ferro. Demonstrando como a representação é uma ferramenta única para a Arqueologia do Corpo, procura-se expor brevemente o enquadramento teórico, sublinhando os benefícios e limitações de estudos na longa diacronia, com áreas de estudo amplas e múltiplas escalas de análise.


Acessar a palestra no seguinte enlace: aqui


domingo, 20 de novembro de 2022

Repensar as Migrações na Eurasia Pré-histórica


Rethinking Migrations in Late Prehistoric Eurasia


Fernández-Götz, M., Courtney Nimura, C. Philipp W. Stockhammer, Ph.W, & Cartwright, R. (edits.) (2022): Rethinking Migrations in Late Prehistoric Eurasia. Proceedings of the British Academy


Sinopse: 

As migrações constituem uma das características mais definitórias da história humana desde seu início até o presente. Nos últimos anos, a crescente aplicação de estudos antigos ADN Antigo e isótopos estáveis tem revolucionado nossa compreensão dos movimentos populacionais no passado, embora a interpretação dos resultados ainda seja ainda pouco clara e controversa. 


Repensar as migrações na Eurásia tardo-pré-histórica tardia fornece uma visão da pesquisa de ponta sobre as migrações pré-históricas na Eurásia, integrando diferentes perspetivas de evidências e enfatizando a necessidade de combinar as análises zooarqueológicas com uma base teórica e metodológica mais sólida



Os 15 capítulos do livro vão desde o 3º ao 1º milénio aC, com um escopo geográfico que se estende da Europa Atlântica à Ásia Central. Os estudos de caso incluem uma reavaliação de migrações em grande escala, mas também estudos de alta resolução sobre microrregiões concretas. 


No geral, os resultados oferecidos no volume revelam a extraordinária diversidade das migrações na Eurásia Antiga e dos jeitos nos que a arqueologia pode contribuir a uma discussão mais ampla sobre a própria mobilidade tanto no passado como no presente.


INDEX

Rethinking Migrations in Late Prehistoric Eurasia: An Introduction
Fernández-Götz, M., Nimura, C., Stockhammer, Ph. W & Cartwright, R.

Comparing Apples and Oranges? Confronting Social Science and Natural Science Approaches to Migration in Archaeology, 
Gori, M. & Abar, A.

The Mobility and Migration Revolution in Third Millennium BC Europe, 
Heyd, V.

Bell Beaker Mobility: Marriage, Migration, and Mortality, 
Fitzpatrick, A. P.

Bronze Age Travellers, 
Kristiansen, K.

Andronovo Mobility Revisited: New Research on Bronze Age Mining and Metallurgical Communities in Central Asia, 
Stöllner, Th.; Özyarkent, H. & Gontscharov, A. 

Rethinking Material Culture Markers for Mobility and Migration in the Globalising European Later Bronze Age: A Comparative View from the Po Valley and Pannonian Plain, 
Molloy, B., Bruyeres, C. & Jovanovi, D. 

Mobility at the Onset of the Bronze Age: A Bioarchaeological Perspective, 
Stockhammer, Ph. W. & Massy, K.

Marriage, Motherhood, and Mobility in Bronze and Iron Age Central Europe, 
Rebay-Salisbury, K.

Migration in Archaeological Discourse: Two Case Studies from the Late Bronze and Early Iron Age, Metzner-Nebelsick, C.

The Scale of Population Movements: A Model for Later Prehistory, 
Wells, P. S.

Alpine Connections: Iron Age Mobility in the Po Valley and the Circum-Alpine Regions, 
Icolani, V. & Zamboni, L.

Mobility and Migration in Bronze and Iron Age Britain: The COMMIOS Project, 
Armit, I.

Migration and Ethnic Dynamics in the Lower Rhine Frontier Zone of the Expanding Roman Empire (60 BC-AD 20): A Historical-Anthropological Perspective
 Roymans, N. & Habermehl, D.

On the Move: Relating Past and Present Human Mobility, 
Nimura, C., Cartwright, Stockhammer, Ph. W.; Fernández-Götz, M.


+INFO sobre o livro no enlace: Rethinking Migrations

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Copos, Caldeirões, Mortos e Banquetes

Este estudo trata a expansão geográfica de um traço concreto das culturas élitares do I Milénio, o uso em principio secundário de vasos de bronze, originalmente pensados para conter líquidos em cerimonias que implicavam o consumo alcoólico, como urnas cinerárias.  

Carrinho-Caldeirão de Skallerup, Museu Nacional de Dinamarca

A similitude de este ritual funerário é o descrito em fontes épica como a homérica Ilíada ou nas fontes hititas da Idade do Bronze, tem chamado a atenção a atenção do arqueólogos no intento de cartografar e explicar o expansão do costume da incineração sobre a inumação no Mediterrânea, e do uso de este tipo de contendor mais em concretos para tal fim.

Restituição gráfica do Carrinho-Caldeirão de Skallerup (Dinamarca)

Este estudos normalmente tem enfatizado a relação de esta pratica com a expansão de um pacote que amostra uma serie de objetos comuns que vão da mão da adoção de uma serie de praticas como parte de uma cultura de elite, que traspassa diversos âmbitos culturais. Instituições como o banquete, a adoção de determinadas formas de guerra e armamento e os valores, ou mesmo evolução política que estariam associados a estes câmbios, tem sido temas frequentes de estudo nas últimas décadas entorno a mobilidade e os contactos transculturais (e coloniais) na Proto-historia europeu e da área Mediterrânea em particular.

Espada hallstattica do s. IX a. C. Naturhistorisches Museum Nürnberg, foto: Oliver Dietrich 

Oriente Próximo (fundamentalmente o Levante), Itália, Grécia e os Balcãs ou o levante peninsular tem sido zonas abundantemente estudadas em essa linha de pesquisa, sem desbotar estudos que enlaçam também com o mundo Centro-Europeu e Atlântico como o volume de Sabine Gerloft sobre os caldeiros e sítulas do Bronze Final-Ferro no PBF. Este estudo que aqui recenseámos pretende abrir a um área mais geral sistematizando os dados sobre os enterramentos em vasos metálicos gerados desde o Mar Negro até Centro-Europeia em conjunto como os conhecidos do mundo mediterrânico.

Vaso anfórico de Gevelinghausen, carrinho votivo de  Acholshaussen, vasos e sítulas hallstáticas

Esta perspetiva pan-europeia permite mostrar uma serie de regularidades, como a prevalência de contendores para bebida no uso de Urnas metálicas, um 95% dos 598 totais do corpus coincidem em este padrão. No que em palavras da autora exemplifica claramente:  “A estandardização e continuidade de essas práticas aristocráticas práticas enfatizavam o status social de essa elite, o qual contribuíam a legitimar e perpetuar”

Distribuição das urnas metálicas a finais do s. VIII a.C.

Assim como Grécia parece ser o núcleo inicial de este uso, as primeiras a mostras fora de este contexto semelham proceder da região alpina, a ambas as duas beiras da cordilheira se topam este tipo de vasos em um contexto temporal que vai do s. XIV ao IX a.C. Ao norte dos Alpes este tipo de enterramentos se topam em zonas do Sul de Alemanha e Escandinávia e no SE de Centro-Europa, pré-datando esta prática em vários casos a cronologia dos Campos de Urnas (XIII- VIII a. C) onde se mantêm até a fase Hallstatt C.

Diversas urnas cinerárias de tradição dos Campos de Urnas da Cultura Villanoviana: urna de Bronze, com tapadeira imitando capacete, urna cerâmica brunida (para imitar o aspeto metálico) fechada com capacete metálico, urna cerâmica fechada com tapadeira em forma de copo; Urna cinerária canópica de época etrusca.  

Durante o período que vai entre o S. IX e VIII observasse uma expansão de este tipo de praticas unido frequentemente a expansão da Cultura dos Campos de Urnas assim como a uma serie de item de prestigio como caldeiros, determinado tipo de armamento, tanto na parte Oriental de Europa como na Itália (da Etrúria ao Lácio ou Campânia).

As similitudes entre as urnas bitroncocónicas itálicas e norte-europeias, mesmo em regiões tão longanas como Escandinávia, são significativas, o qual se observa tanto nos exemplares cerâmicos como metálicos, fechados normalmente com um casco que coroa ao defunto em um identificação corpo-urna que preludia as posteriores urnas canópicas etruscas, ou por patadeira com forma de copo aludindo de novo a âmbito convivial. 

Distribuição das urnas metálicas a meados do s. VI a.C.

Incluísse aqui também outras tipologias como as sítulas, caldeiros ou cistas, junto a exemplar tipo ânfora em algum contexto, usados com a mesma finalidade ou relacionados de um ou outra forma com o banquete. Nas área mediterrânea as urnas metálicas apresentam uma menor uniformidade respondendo a tradições locais, casos como o cipriota, ródio, ou na Magna Grécia, tradições em alguns casos desaparece rápido, entanto que em outros contextos do âmbito grego permanecera muito a posterior. Segundo a autora esta permanência estaria relacionada no mundo grego com peso da tradição épica homérica na cultura aristocrática. 

Vaso anfórico de Gevelinghausen, Museum für Archäologie Herne. foto: Dieter Menne

Zonas mais periféricas m contacto com o âmbito grego e itálico como o Adriático parecem amostrar um padrão funerário mais hibrido que combina a incineração com o costume autóctone de inumação. Em contexto centro-europeu e França a prática de incineração é substituída pela inumação durante o Ferro e os poucos casos de enterramentos em urna parecem ter conexões com o mundo itálico, se a incineração contínua predominando dentro da periferia etnicamente germana.


Bibliografia: 

Desplanques, E. (2022): "Protohistoric metal-urn cremation burials (1400–100 BC): a Pan-European phenomenon" Antiquity Nº  96/389 pp. 1162–1178  DOI: 10.15184/aqy.2022.109


quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Construindo a Proto-história - Congresso

Construire la Protohistoire

hier, aujourd’hui, demain


Quando: 13-15 Março
Onde:  Mont Beuvray
  


As novenas Reuniões de Doutorado da Escola Europeia de Proto-história de Bibracte (EEPB) serão realizadas de 13 a 15 de março de 2023, no Centro Arqueológico Europeu de Bibracte (Borgonha, França). Desde 2015, estes encontros visam reunir doutorandos e jovens médicos que trabalham em torno de questões comuns relativas às Idades do Bronze e do Ferro em toda a Europa. 

Para as reuniões deste ano, os participantes são convidados a apresentar suas pesquisas sobre o seguinte tema: "Construindo a proto-história – ontem, hoje, amanhã". A noção de “Protohistória” no contexto europeu responta a realidades culturais e temporais diversas. As próprias origens do termo -Protohistoire, Protostoria, Frühgeschichte, Protohistory, Metal Age- não são objeto de amplo consenso. Questionar a constructo da Proto-história nos permite destacar o polimorfismo do termo e do que ele abrange. O desenvolvimento das pesquisas em torno das populações envolvidas está longe de ser homgeneo e depende, em grande medida, de descobertas emblemáticas e de estudiosos, pioneiros que se adicaram a investiga-las.


Para superar as deficiências ligadas à ausência de fontes escritas, os pesquisadores têm mostrado um grande engenho, adaptando métodos e conceitos emprestados de outras especialidades. Com isso, eles participaram ativamente na formação da disciplina. Dito cracter multidisciplinar é, ainda hoje, uma das características próprias do proto-historiador. Agora, a Arqueologia virouse para os dados saídos da biológia e o DNA , de forma mais geral, as novas tecnologias para reconstruir, da forma mais ajeitada, essas sociedades há tempo consideradas bárbaras.


O alvo do encontro é estimular aos participantes a expor suas pesquisas sobre uma Proto-história diferente da que se tem reconstruído em outros períodos da história da disciplina. Os participantes nestes encontros serão convidados a inscrever as suas comunicações ou posters numa das três áreas seguintes

As contribuições podem assumir a forma de comunicação oral (20 minutos) ou de poster (acompanhada de uma comunicação curta de 5 minutos). As propostas devem ser enviadas até 6 de janeiro de 2023.


Convocatoria:




+INFO no site do: EEPB

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Mãos no Passado - Objeto, Rito e Simbolo

Outra mão bronzinea, esta topada na Suíça (a Mão de Prêles), e parece que iria não pendurada de nenhum sitio ou mesmo poderíamos dizer que mais que fora colgando de alguém, a jeito de refulgente prótese. Seria necessário imaginar o tom dourado pálido que teria o bronze da peça antes de colher sua patina verdinha, o que faria jogo, ainda que abaratando o custo, com a custosa fita de ouro que decora o remate da "empunhadura", se nos permitis o termo, ainda que, ao melhor, no punho não iria já.

Objetos recuperados do enxoval recuperado do tumulo de Prêles (Berna, Suiça)

    
A Mão de Prêles foi topada por um detetorista por acaso,  bom se é que assim se lhe pode chamar a um senhor que sai ao monte com um detetor de metais e “casualmente” topa metal. Deixando isto a um lado, o caso é que uma escavação posterior confirmou a mão que formava parte do enxoval de um tumulo que continha o corpo de um homem adulto e do qual o Carbono catorze deu uma datação entre o 1500-1400 a.C (e dizer o século XV mas a.C) ou em termos arqueológicos no Bronze Meio centro-europeu.

Excavações da tumba de Prêles (Berna, Suiça) 

Qual seria sua função?: Objeto ritual?, amuleto?, elemento ortopédico?. Um colega mesmo me sugeriu hoje em comparação com o punhal um possível uso como arma: já pudemos imaginar a muito dantesca cena de olhos tirados da testa ou pinchados nos metálicos dedos, ou ainda saltando pelo campo de batalha, ou de gorjas degoladas por golpes de mão, imagens desacougantes que algo de arrepio dão de certo.

Mãos e mascara da tumba de Großklein (Austria), s. VI a.C.


Independentemente das dúvidas que podamos ter sobre cada hipótese ou mesmo sobre a eficácia de técnica marcial em combate do tipo ataque dedos-olhos, o certo é que obviamente algo fica claro, e é um objeto assim não o levaria qualquer, já fora este tenente um nobre, chefe ou sacerdote (quem saberá?). Suponho que a parte do ar de família com o de Irulegi algum estará já especulando com o paralelo com deuses gaélicos mutilados e com mãos sucedâneas de prata

Inscripção a Marte Nodons, e diadema votiva, com o deus pressentado como um Helios-Apolo marinho ambas dois do templo britano-romano de Lydney Park (Gloucestershire), o Idolo de Tandragee (Armagh, Irlanda) interpretado geralmente como uma representação do deus Nuada Airgetlám

   
É quase inevitável que não sai evocado na nossa mente a imagem de esse Nuada “Mão/braço de Prata” (Airgetlám), aquele rei dos deuses irlandeses que tem que abandonar o trono ao ser mutilado a sua mão num combate, a soberania sacra não aceita deforme, eivado nem tolheito no seu exercício. Até que finalmente lhe fora implantada prosteticamente (foi Nuada o primeiro cyborg?) uma mão argêntea forjada pelo metalúrgico dos deuses (Goidnu). Ou os casos cruzados, como no seu dia estudara Dumezil, de um escandinavo Tyr, deus guerreiro e juiz, ou um Mucio Scevolla herói da Roma Arcaica, que perdem ambos dois a sua mão simetricamente como consequência de um falso juramento.

Mãos destras unidas, tésera de hospitalidade de Paredes de Nava (Palência)

Também se pode lembrar ao respeito a longa tradição jurídica que o gesto da união de mãos  (dextrarum iunctio, gr. dexiosis) tem para selar um pato, acordo; ou negocio, simbolismo refletido tanto no direito latino mais antigo como no mundo celto-hispânico, onde arqueologia no-lo amostra claramente através alguns suportes de pactos de “hospitalidade” (tesserae), que adquirem forma de duas mãos acopláveis uma na outra em uma sólida aperta tão sólida como o próprio acordo que garantem: Uma metade para cada signatário. 

Gesto de dextrarum iunctio entre esposos de um sarcófago romano (Museu das Termas de Diocleciano), anel de fede com mãos apertadas; acordo de cessão de Carcassona entre Ramon Berenguer I e Guilherme de Cerdanha no Liber Feudorum Maior

Uma firme materialização que transcende a própria vida das partes, alongando o pato a sua descendência, pois essa “amizade” se herda, e cada parte da tessera esta chamada assim a atuar como signo de reconhecimento mutuo entre  dois a priori desconhecidos reconhecendo-os no ancestral vínculo. O simbolismo jurídico da mão esta longamente exprimido no mundo Indo-europeu, apenas temos que voltar as analises já citadas de Dumezil, mas também podemo-lo topar em exemplos mais próximo ao nosso contexto temporal e etnográfico. ainda frescos até há alguns anos, na imagem tradicional de dois paisanos selando na feira o acordo de venda com um aperta de mãos, única rubrica precisa para ultimar e legalizar de jeito informal -mas contundente- o acordo oral.

Tratantes de gado fechando o acordo com uma aperta de mão, feira de Laviana (Astúrias) no 1950. Museu do Povo de Astúrias 

  
Também poderíamos igualmente pensar outras aceções do signo, outra funções além do direito; a mão protetora da divindade, que ampara e cobre a seu devoto, como a dum Sabacios de época já romana, da mão cristológica bendizendo ao crente, ou nos raios benéficos do sol-deus que descendiam rematando em de mãos sobre o farão herege (Akhenatão) e sua família, a quem, em alguns relevos pétreos, ofereciam as típicas cruzes ansadas egípcias . 

Mão de Sabazios, Akhenatão e um dos seus filhos bencididos pelas mãos-raios de Aton, a Mão de Deus bendicindo, igreja bulgara do s. VI d.C, uma das mãos da tumba Großklein decorada com diversos signos (apotropaicos?) e perforação para fixa-la a alguma superficie ou pendura-la  

Ou num âmbito menos transcendente e escatológico, pensar na mão ainda servindo de proteção magica em um sentido mais quotidiano, em tanto amuletos populares como a figa que representam uma mão, apertada fazendo um nó com os dedos sobre o polegar, ou bem aberta ao jeito da Mão de Fátima, normalmente decorada com signos mágicos

Figas varias de azibeche nos seus diversos modelos e formas tradicionais, figa com imagem da Virgem da Cabeça (Jaem), figa de cristal de rocha alemã do século XVII ou XVIII

Especular pudemos, sempre e fácil e singelo quando o mutismo taxativo que tantas vezes amostra o registo arqueológico se nos impõe com um longo e incomodo silêncio sobre qual fora contexto “imaterial” de um objeto, ou se prefere “simbólico”, as vezes, este próprio termo “simbólico” (ou no seu defeito ritual) não é mais um eufemismo para escusar um “função desconhecida”. Com um símbolo de tão longa tradição como a "mão direita", que ademais sempre se oporá a outra “mão sinistra”. E digo destra, explicitamente, porque a Mão de Prêles é. casualmente, outra mão direita também, como a de Irulegi. 

Cena de combate da estela de Palao (Alcanhiz) com repressentação sobredimensionada de mão amputada século II-I a.C

Como digo de tudo um pouco pode sair; desde a "fides" e a "hospitalidade" ao heroísmo do que priva da mão da espada a um inimigo (como era usual entre celtiberos e citas), ou mesmo haverá quem apontasse simbologias mais radiantes, e até solares mesmo, algo o pensou no caso de Indra creio que recordar um Max Müller que cegado pela “enfermidade da linguagem” não via mas que Sol por todas partes; ainda que divindade védica seja mais bem um ente tormentoso; seriam seus dedos um lôstrego tal vez?, penso é pouco provável. Seguramente algo acertou embora errou de deus no acerto.

Mão de Irulegi, texto e transcripção da inscripção

Os avatares da "mão destra" são muito e mui variados. Eu não nego uma coisa nem outra, tudo isso pode ser possível e seguramente em tudo ou a menos em parte o será. Que nos dirá Irulegi de todo este puzzle quando algum dia as outra palavras além de esse transparente zorioneku (“felicidade” “boa fortuna”) sejam esclarecidas: 

Mão sobre lintel de um edifico (Valência), mão de Fátima sobre a chamada porta da Justiça da cidade de Granada (s. XIV), chamador de porta tradicional com mão e esfera, Mão de Fátima-chamador de uma casa marroquina

Será uma “bem-vinda”, um texto de saúdo ou bênção, que indicara a hospitalidade para quem chega desde longe a essa morada, um carme protetor? poético texto ou apenas uma mais prosaica formula não cantável?; uma proteção contra a desgraça ou uma chamada (e evocação) a “boa ventura”, que foi, para mais efeito (verba volant scripta manet) materializado fisicamente sobre um objeto, objeto que, ao melhor, pudera ter já por sim próprio uma função como amuleto (a jeito de Mão de Fátima ou figa) ... ou seria tudo um pouco de tudo isto?. 

"cem mil (vezes) bem-vindo" expressão gaélica de bem-vinda na porta de uma morada (Guitiriz, Galiza), foto do autor

Fica-nos a nós especuladores gratuitos, e impaciente, a esperar fazendo profissão de precaução, até que chegue o ditame dos que sim sabem de línguas, toca-nos agora calar: Que falem os filólogos!


Bibliografia:

Almirall Arnal, E. (2020): "La dextrarum iunctio y su evolución a los anillos de fede. Algunos ejemplos en gemas del Museo Arqueológico Nacional (Madrid)" " Boletín del MAN Nº  39  pp. 139-154  PDF

Beltran Lloris, F., Jordán Cólera, C. & Simón Cornago, I. (2009): "Revisión y balance del corpus de Téseras Celtibéricas" Palaeohispanica Nº 9   pp. 625-668  PDF

Dumézil, G. (1985): Heur et Malheur du guerrier, aspects de la fonction guerrière chez les Indo-Européens. Flammarion, Paris. aqui

Nováková, L. & Pagáčová, M. (2016): "Dexiosis: a meaningful gesture of the Classical antiquity" ILIRIA International Review Nº 6/1  pp. 207-222   PDF

Oehrl, S (2008) “Uber die vermeintliche indische Parallele zur Einhändigkeit des germanischen Gottes Tyr und des keltischen Gottes Nuadu: Ein Klärungsversuch” Münchener Indologische Zeitschrift Nº 1 pp. 208–223  PDF

Pita Beceiro, I (1994): "El escrito, la palabra y el gesto en las tomas de posesión señoriales" Studia Historica. Historia Medieval Nº 12  pp. 53-82   PDF

Ricks, D.S (2006): "Dexiosis and Dextrarum Iunctio: The Sacred Handclasp in the Classical and Early Christian World" FARMS Review Nº 18/1  pp. 431–36  PDF

Rhys, J (1888): Lectures on the Origin and Growth of Religion as illustrated by Celtic Heathendom. William and Norgate, Edinburgo  archive.org

Sopeña Genzor, G. (2009): "Acerca de la amputación de la mano diestra como práctica simbólica: el caso de Hispania en época de las guerras celtibérico-lusitanas" Saldvie Nº 8  pp. 271-283 DOI: 10.26754/ojs_salduie/sald.200886583

Schaer, A.; Kissling, Ch.; Alterauge, A. & Brechbühl, S. (2019): "Die Bronzehand von Preles (Kt. Bern/Ch). Die Älteste Anthropomorfe Bronzeplastik Europas?" Archäologisches Korrespondenzblatt Nº 49  pp. 57-69   PDF

Schaer, A., Brechbühl, S, Senn, M. et alii (2021): Das bronzezeitliche Grab und die Bronzehand von Prêles. Hefte zur Archäologie im Kanton Bern Vol. 8   PDF

Wheeler, M. (1932): Report on the Excavations of the Prehistoric, Roman and Post-Roman Site in Lydney Park, Gloucestershire. Oxford University Press, Oxford  DOI: 10.26530/20.500.12657/50813


AGRADECIMENTOS: Temos que agradecer a Nina Willburger, Eloi Saavedra e Álvaro Gómez Peña a informação prestada, comentários e algumas que outras imagens,, obrigado.


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