Topáramos hoje por mero acaso com o vídeo de uma palestra de Umberto Maturana, no que este biólogo e teórico expõe a sua ideia sobre as sociedades e qual era a natureza -permutasse-nos o termo por ajeitado ao contexto- da sociabilidade humana.
Na palestra se faz se uma interessante e didática exposição na que se traçam conexões entre a evolução natural e social (o qual com certos limites não é uma ideia que nos desgoste, vid. aqui e aqui) mas também se incide crucial cambio que supõe a capacidade linguística para determinar a evolução cultural e não-natural do ser humano desde que é tal.
Uma magnífica exposição ainda que temos que dizer, também não se mete no problema que faz que seguindo o seu argumento, "todo o que deveria sair bem" de facto ao final "saia sempre mal" (o recurso a diferencias culturais, tal vez é pouco, satisfatório ou convincente). Pelo que estas reflexões incidentais e algo inconexas que vão aqui anexadas não serão tanto uma recensão no dito da palestra (para isso convidamos a escutar o vídeo embaixo) senão de coisas que nos sugeriu a exposição e outras que votamos em falta em ela. Como bem diz o palestrante a experiencia parte não do que comunica senão do que escuta o dito como o "background" que leva já dentro da sua testa, pelo que bem a continuação é subjetivo
Mas não divaguemos mais, qual é isso fator disruptivo que botáramos em falta no fio basicamente proativo da argumentação?. Cuido que esse não é outro que o palestrante próprio assina-la: A Linguagem. Certo é que a capacidade linguística do ser humano e a complexidade lhe proporciona enormes possibilidades e uma certa flexibilidade inusitada para recontextualizar-se em outros habitats e tempos, mas também o é que essa mesma capacidade linguística permite ambiguidade, a ironia, o dobre sentido, a metáfora, amplia, assim mesmo, as possibilidades de confusão, mal interpretação, obscuridade contextual, equivocação involuntária ou engano consciente.
"Minha mulher e a minha sogra" bebuxo de William Ely Hill (1915)
Pode que as formigas o têm muito fácil porque o seu mundo muito complexo e em realidade simples, e esta totalmente predeterminado em cada ato, não há eleição mas tampouco incerteza nem alvedrio, mentes que a nossa forma de complexidade consiste justo na impossibilidade inerente que temos de chegar essa simplicidade pelos presencia constante esses feitos (opções, incerteza, ação que precisamente estão ausentes da complexa vida cotia das abelhas, formigas ou termites.
Esta eiva que temos é na nossa impossibilidade para o reducionismo (que nos leve a eutaxia pura a nível da avelhas ou termite) e que se mostra na cambiante história humana e social, tem por outro lado um papel muito importante na nossa variabilidade tanto histórica como geográfica, cada cultura é do seu lugar e responde ao seu contexto de devir e circunstâncias. Unasse a isto que a própria metáfora com os insetos sociais não foi alheia, em certa forma, tampouco a este blogue (vejase aqui)
A este motor que propulsa o nosso cambio descontínuo se lhe poderia chamar "progresso" mas creio que entender que a linha vai sempre direta a um objetivo predeterminado na sua mecanicidade (maior complexidade, maior paz, bem-estar, civilização, “qualidade” de vida) ou, ao menos, numa mesma direção constante ainda que por diversos caminhos (multilineares). Por esta via há o perigo e a tentação de medir cada trajetória cultural como um “sucesso” ou “fracasso” com respeito a proximidade ou alongamento do objetivo pressuposto.
Tudo isto é profundamente erróneo, em primeiro lugar, porque o único objetivo que se poderia aduzir não é aumentar senão mais bem “reduzir”, não se busca ser mais complexo senão, ao contrario, queremos ser mais simples e simplificar a nossa realidade. E isto tampouco se pode descrever como "progredir" porque, como se entende, isto não é desde logo uma história de sucesso senão de fracassos constantes; possivelmente a única constante histórica incontrovertível que qualquer escola pudera assumir, sem maiores problemas, o “fracasso”.
Alicerces do Teatro de Marcelo, G. B. Piranesi (1761)
Os únicos sucessos são apenas períodos temporários em que se consegue retardar -as vezes mediante escapismos sociais, económicos ou culturais a queda no fracasso durante um breve ou mais amplo período de tempo. Em essa carreira em realidade, cada avance cara adiante em aparência a prol do objetivo, se torna um passo em falso, que nos leva em realidade vários passos ate atras; alonga-nos do anelado no entanto conduzindo-nos pela direção contrária (a vezes o signo de prosperidade apenas é índice profundo da crise próxima): ampliando -ainda mais- o amplo rádio no que agir com as complexidades com que temos que lidar: os conflitos, contradições, tensões, falhos estruturais, ou debilidades criticas que emergem a medida que medra o tamanho da própria rede.
Será por isso que dos dinossauros agora apenas fica petróleo e nos mesmos, no entanto, procedemos mos de uns bichinhos pequenos que se escondiam daquela no subsolo no entanto seus parentes reinavam fora, no exterior? E é por isso mesmo que as sociedades humanas são instáveis, evoluem ou se adaptam ao câmbio, ao menos de momento ... Deixai ainda que cheguemos a idade de dinossauros. Na nossa diversa complexidade tanto as versões mais "simples" do que cabe de nós como as mais "complexas" tem as suas próprias falhas e pontos fracos cada uma.
The Bone War, do pintor Adam Miller (2015)
Por exemplo uma sociedade tradicional / pré-industrial pode ser mais resistente a determinadas questões do que uma civilização industrial ou post-industrial, precisamente pelo facto de ter menos interconexão e que o circuito mais curto das suas de conexões se baseie na proximidade; sendo o acesso as matérias e recursos uteis fundamentalmente local ou regional. Embora Igualmente estas entidades tradicionais são mais frágeis a outras problemáticas que podem provocar seu colapso acelerado, por exemplo quando algum grande câmbio: social, económico, político (que maior parte das vezes vem juntos ou próximos entre sim) mina as suas formas de organização primária e estruturas fundamentais, como a unidade domestica, o parentesco ou os laços comunitários, nos nas que fundamentam os outros elementos (produtivos, ideológicos, relações sociais) de essas sociedades,.
O outro tipo: as sociedades de tipo de sociedades no entanto: as (post-)industriais podem subsistir -ao menos aparentemente quase como cultivos hidropónicos sem enraizamentos claros e estáveis dos indivíduos que as formam, ou quanto menos reduzindo ao mínimo o contacto com estes elementos fundamentais da sociabilidade (o celebre “anonimato urbano” que alguns entendem como “libertador” e para outros é simplesmente “soidade”) ou qual não significa que isto seja especialmente bom, nem sano
A frequência de problemas mentais e psicológicos nas sociedades contemporâneas assim parece constata-lo, e experiencias recentes como a do “confinamento” pela pandemia, deveriam indicar-nos visivelmente os efeitos que uma redução da proximidade social e uma interrupção interação humana drásticas podem ter para a vida humana.
pormenor de uma obra do artista ucraniano Denis Sarazhin
A realidade atual constata de facto uma sociedade (post-)industrial e global fortemente interconectada pode mostra-se especialmente débil, naqueles elementos que eram precisamente as suas fortaleças, fronte ou perturbações que não fariam pestanejar sequer a qualquer sociedade tradicional antiga ou moderna: pouco importa uma folga de condutores de camiões pelos preços mundiais do combustível, e o desabastecimento de produtos básicos que pudera gerar, se o supermercado esta contido, em boa parte na horta há a poucos metros ao pé da própria casa.
Por tanto a elementos mais que fundados para duvidar da noção própria de “progresso” e do seus corolário na ideia de complexidade crescente e imutável que pressupõe progredir, já que o único objetivo percetível no devir humano e em qualquer estadio e a busca de uma solução que simplifique os problemas aos que nos enfrentamos. A esse objetivo hipotético que alimenta e faz de combustível a nossa curiosa e paradoxal forma de buscar a simplicidade, algum filosofo a denominou, como já disse, com um termo algo pretensioso: eutaxia; postulando de passo, como Hegel, que a ela apenas nos conduziria o providencial Estado (?)
Que esta seja a maquinaria ou a ferramenta adequada, é coisa abonde discutível já a estas alturas da história. Aparte do já pelo já exposto acima, um indicio acaido pode ser entre outros, o próprio facto de que a antinomia que no seu dia assinalou Rousseau sobre a função do Estado: Entre o que o Estado"foi/é" (instrumento de Desigualdade) versus o que "deveria de ser" (o “Contrato” Social), fique ainda a dia de hoje -quase dois séculos depois irresoluta, sem uma resposta clara ou aparente que ofertar ao respeito.
É essa simplicidade sempre buscada é desejada, mas nunca alcançada na sua quietude, a que se expressa ao longo da história: desde a utopias sociais até essa redução a fragmento legíveis da totalidade do real que chamamos ciências, passando, claro esta, pela ideologias. A comunidade politica como expressou o defunto D. Graeber (emulo, em certa forma, em isto sem sabe-lo de Platão ou Aristóteles) sempre se funda essencialmente num intento de materializar algum conceito “utópico” abstrato que lhe serve de justificação e faz, a fim, sentido da sua caótica vida social.
Sem comentários:
Enviar um comentário