terça-feira, 4 de abril de 2023

A Persistência da Genética do Mesolítico


Um recente artigo publicado no jornal Quaternary International achega uns interessantes resultados sobre a evolução genética do Ocidente Peninsular entre o Mesolítico e Neolítico, constatando uma permanência, e mesmo um incremento da ancestralidade dos caçadores-recolectores na fases Medias do Neolítico, evidenciado pelas sepulturas megalíticas. 


O artigo empeça fazendo uma revisão historiográfica sobre a pesquisa megalítica, empeçando pelas teorias migracionistas anteriores as datações de C14, que viam no megalitismo simplesmente uma difusão de modelos mediterrâneos, passado pela virada cronológica e interpretativa que supus a evidência da maior antiguidade do Megalitismo Ocidental com respeito aos paralelos mediterrâneos considerados até daquela. 



Também recordam a adoção a partir dos anos 60 de um novo paradigma por vários arqueólogos Peninsulares ou que trabalharam na Península (como os Leisner) propondo um origem hispânica do fenómeno megalítico. Aos respeito Bosch Gimpera seguindo a Miguel Heleno sugeriu um origem do megalitismo a partir da população dos grupos mesolíticos como os da necrópole de Muge. A perspetiva proporcionada pela arqueologia pré-histórica se véu unir nos últimos anos a aporte da paleo-genética. 

Os autores fazem uma síntese dos resultados de ADN Antigo obtidos no contexto português e do resto da Europa nos últimos anos. Tanto no contexto peninsular como europeu se observa uma grande heterogeneidade durante o Neolítico Médio mostrando uma mistura de linhagens tanto de agricultores de origem anatólica e levantinas como caçadores-recolectores europeus ocidentais com diversas gradações regionais. 

expansão do Neolítico desde Oriente Próximo à Europa segundo Gronenborn

Assim a área danubiana, os Balcãs e os grupos mediterrâneos da Cerâmica Cardial (incluindo o Levante da Península Ibérica) mostram uma predominância do novo genoma dos colonizadores agrícolas, no entanto que na Centro-Europa e Ocidente da Europa, e Portugal, semelha existir um maior proporção do ADN de caçadores-recolectores junto o dos agricultores. 

proporção no ADN mitocondrial e cromossoma Y de genética pré-neolítica e do Próximo Oriente no contexto da pré-história Peninsular

Esta permanência da pegada genética do caçadores mesolíticos em populações plenamente neolitiçadas plante 2 questões: Como entender o próprio processo de aquisição do pacote neolítico na Ocidente Peninsular? Assim como como explicar o aumento proporcional da ancestralidade mesolítica a partir do Neolítico Médio. A primeira questão leva a presentar a expansão do neolítico além da mera expansão demográfica de migrantes neolíticos pranteando a necessidade de entender este fenómeno como um processo complexo no qual junto a populações forâneas se da um processo de aculturação e integração de populações mesolíticas. 

haplótipos entre o Mesolítico Final e Neolítico Final em Portugal

Os autores observam um lapso de coexistência entre grupos agrícolas e caçadores de circa uns 1500 anos até a integração final de ambas populações, desde os primeiros núcleos neolíticos na zona costeira a expansão posterior ao interior e Norte (até Galiza). Sobre a ressurgência neolítica os autores pranteiam como hipótese fatores de estrutura social e demográfico. 

sequência crono-cultural do processo de neolitização no Ocidente Peninsular

A própria adoção da cultura neolítica por antigos caçadores-recolectores com a produção de alimentos  levaria a um aumento demográfico. A sua vez a adoção de uma possível organização patrilinear também influirá na curiosa homogeneização nos haplogrupos uniparentais masculinos (cromossoma Y). Segundo os autores: 

"Uma possível explicação para o Oeste da Península Ibérica é que os grupos caçadores-coletores foram assimilados culturalmente durante as fases Cardial e Epicardial do Neolítico (Tabela 1) – não apenas pela adoção de novas práticas de subsistência, mas também pela reorganização social e aquisição de novos comportamentos simbólicos e visões de mundo - enquanto mantém um perfil ancestral distinto por meio de práticas endogâmicas duradouras. Se um desequilíbrio demográfico em favor dos caçadores-coletores locais e um evento de “boom” populacional após a introdução da agricultura – como preveem os modelos de simulação para o Neolítico Inferior —são levados em consideração, esses fatos explicariam o domínio da ancestralidade WHG posteriormente. Consequentemente, as regras de patrilocalidade (que se presume terem sido a norma durante o Neolítico) também podem explicar a prevalência acima mencionada do DNA Mesolítico"

Em quanto a estrutura socioeconómica o artigo pranteia uma sociedades organização segmentar em grupos humanos de pequena escala independentes política e economicamente estendida por distintas áreas geográficas e ecológicas. Esta organização seria coexionada a um nível mais amplo pela existência de uma unidade cultural supra-regional que se amostra em mesmos elementos ideológicos e políticos partilhados que reuniriam as comunidades dispersas. Estas relações a escala maior poderiam estar relacionadas com os padrões genéticos que se observam diacronicamente e a possível estrutura patrilinear das sociedades neolíticas.


Artigo

Carvalho, A. F, Fernández-Domínguez, E., Arroyo-Pardo, E., Robinson, C., Cardoso, J.L., Zilhão, J. & Varela Gomes, M. (2023):  "Hunter-gatherer genetic persistence at the onset of megalithism in western Iberia: New mitochondrial evidence from Mesolithic and Neolithic necropolises in central-southern Portugal" Quaternary International  2023 DOI: 10.1016/j.quaint.2023.03.015  


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